"Se chorei ou se sorri, o importante é que em Poções eu vivi"

terça-feira, 8 de maio de 2012

Festa do Divino - entrevista

Entrevista concedida ao repórter Fábio Júnior Souza Lopes, publicada no site  www.uniaoperfeita.com


UP - O que é a Festa do Divino em Poções?
A Festa é tradicionalmente religiosa, uma devoção do povo poçoense. Alguns fatos marcam exatamente essa devoção e evidenciam atos religiosos ligados ao passado. Por exemplo: a Bandeira revive a chegada daqueles que fundaram a nossa cidade. O Mastro, relembra a mudança da capela que existia atrás do Grupo Escolar Alexandre Porfírio para a atual igrejinha.

Então, eu acredito que todas essas manifestações, ao longo dos anos, reforçaram a fé do povo e fortificaram a Festa, que se tornou, evidentemente, no importante marco religioso da nossa cidade.
UP - Quais foram as mudanças e as permanências que você observou da década de 90 para cá?
Permaneceram os dois eventos acima graças aos esforços de alguns poucos, capitaneados pelo Sr. Homero.  As particularidades da Festa de largo mudaram bastante. Antigamente, a praça era uma continuação festiva dos eventos religiosos – o parque era na praça principal com alto-falantes. O pavilhão pertencia à igreja e lá se realizava o leilão de objetos ofertadas pela população, inclusive quermeses de um modo geral. Essas coisas geravam recursos para a Igreja.

As barracas, que eram consideradas avançadas para a época, pertenciam aos estudantes das diversas séries do curso Ginasial, com o objetivo único – arrecadar dinheiro para se efetuar uma viagem quando se completava a quarta série ginasial, que nós chamávamos de “embaixada”. Então, se vc se posicionar fisicamente de costas para a Igrejinha, o pavilhão ficava ali. O parque na sua frente, no meio da praça. Do lado direito, as barracas do Ginásio. Do lado esquerdo, defronte ao Isaias Alves, as tradicionais Barracas de Dona Alvina, Dona Lourdes, entre outras. Ao lado da entrada da praça onde residia Afonso Manta, ficavam os “botequins”, que eram realmente a parte profana da época. 
No pavilhão, se apresentava a Filarmônica e, depois, alguma banda de música local ou contratada pela Prefeitura. Naquele momento, eu acho que a Prefeitura passou a assumir esse papel e “tomou” da Igreja o pavilhão da Festa. Daí em diante, a política imperou e cada vez mais as bandas e as atrações principais  passaram a tomar conta da praça. O parque foi empurrado para outro lado. As barracas passaram a ser estritamente comerciais e mudaram as características da praça. Tomou ares de uma grande festa de largo.

UP - Quais maneiras essas mudanças interferiram na vida das pessoas e no jeito de fazer e pensar a Festa do Divino em Poções?
Essa é uma boa pergunta. Houve uma mistura de velhos e tradicionais frequentadores da Festa com os jovens. Cada um tentou ocupar o seu espaço e o povo começou a sair do pavilhão e frequentar outras barracas. O barulho dos shows ampliado nas caixas de som espalhadas pela praça afastou quem queria conversar e trouxe a turma jovem para o local.

Há uma turma que ainda frequenta o pavilhão nas sextas e sábados – são pessoas da “velha guarda” procurando pelos velhos amigos. Então, aos poucos, a tradição de reencontrar amigos foi se acabando pela falta de opção e estímulo. Não vejo que isso possa ser recolocado no seu devido lugar se não houver bom senso. Esse espaço e o momento podem ser melhorados se a programação musical da tarde desses dias (sexta e sábado) for alterada para músicas adequadas ao pessoal de idade mais avançada. No ano passado, uma banda local tocava com o volume estridente e ninguém tinha coragem de ficar na frente daquele palco devido a baixa qualidade musical. Isso espanta e todos sabem que eventos tem a música como pano de fundo. Enfim, deve ser repensada uma relação custo-benefício.
Entretanto, não estou defendendo a volta ao passado. Defendo a utilização racional do espaço, agradando a todos o cleros. Os jovens devem ter os seus espaços e lotar as praças. Enfim, todos querem se divertir ao seu modo. Todos querem ver uma atração famosa. Quem não quis ver Leonardo, Daniel ou outras atrações? Até eu.

UP - Na sua opinião quais foram as razões que levaram a possível desvinculação entre o profano e religioso nos festejos do divino?
Sem dúvida, os dois maiores protagonistas da Festa são a Prefeitura e a Igreja, que representam o profano e o sagrado, respectivamente. A Igreja tá lotada e a praça mais lotada ainda. Teoricamente, os dois fazem bem os seus papéis e atraem as pessoas para os seus espaços. O que a Igreja reclama é que existe muita carência da população e poderia ser amenizada pelo dinheiro que a Prefeitura gasta. Isso gera o desgaste e se alfinetam. A Festa é um prato cheio para os políticos e cada um deles quer aproveitar para mostrar a sua força e garantir o apoio futuro.

Não acredito que em Poções as coisas tenham que ser diferentes dos outros lugares. Devoção, oração e festas andam juntas em todos os cantos desse mundo. Acho que deve existir bom senso e evitar os exageros. A Prefeitura pode reduzir os seus gastos com algumas inutilidades culturais (bandas sem estrutura e conhecimento musical). Deve incentivar para que os recursos gastos, na maioria, fiquem na cidade.
UP - Podemos dizer que a proposta da igreja em separar o profano do religioso causou uma guerra santa em Poções? Porque?
Não vejo que tenha se tornado uma guerra-santa, porque não se enxerga uma guerra definida entre duas posições religiosas. Acho que existem posições “políticas” pelos interesses que os dois lados têm. No meio dessas posições, está o povo, que imagino, sem opinião definida e na expectativa de uma boa solução. Ninguém, de sã consciência vai querer que a Festa se divida. Minha opinião é que existem dois eventos fundamentais - a Chegada da Bandeira e o Mastro. Numa possível separação de datas, haveria um esvaziamento e o fim da Festa seria decretado.

UP - De fato essa desvinculação aconteceu?
Com certeza elas estão desvinculadas nos seus interesses, mas unidas na tradição e na fé do seu povo.

UP - Quais valores prega hoje a Festa do Divino? E quais pregaram a 10 ou 15 anos atrás?
O mundo mudou rapidamente e Poções não poderia ficar de fora. Se quiser comparar os valores da Festa de antigamente com os dias de hoje, veja no Museu do Iecem uma gravação de imagens feitas por Pepone, meu irmão, nos anos 80, onde as opiniões das pessoas refletem esses valores. Nas entrevistas, duas perguntas foram básicas e simples: - Você acha que a Festa mudou? - Você acha que a Festa está melhor ou pior que o ano passado?
Veja que trinta anos atrás essa preocupação existia, já acontecia a inversão de papéis. Os tempos eram outros. A tradição era o pano de fundo. O povo se divertia com muito pouco. Era o bastante você reencontrar os seus amigos naquele ambiente. Os perfis da Festa são inteiramente diferentes se comparamos os comportamentos.

UP - Podemos dizer que hoje a Festa do Divino se tornou mais popular do que religiosa?
Popular nos dois aspectos. Mais popular religiosamente e mais popular profanamente. Graças ao Divino, não temos trios elétricos. Isso seria o fim.

Ainda temos orgulho de dizer que a Festa do Divino é nossa. Até quando? Só o Espirito Santo sabe.

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Um comentário:

  1. Oi Lu,
    Você externou nossos sentimentos com muita clareza. O ano passado comemoramos 60 anos de participação na FD, Neste ano não iremos participar fisicamente, porém manteremos acesas as nossas lembranças e participaremos em espirito.
    Beijos,

    Seu irmão, Pepponi

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