"Se chorei ou se sorri, o importante é que em Poções eu vivi"

domingo, 14 de março de 2010

Flamengo, via rádio

Quem é do interior sabe porque o Flamengo é o mais querido e tem mais torcida. A prova disso é a maior quantidade de títulos sobre os eternos fregueses Vasco, Botafogo, Fluminense e, naquela época, América, Bangu, São Cristóvão, etc. e todos os outros nacionais. Se tem mais títulos, tem que ter mais torcida, é claro. E se tem mais torcida, as rádios acompanhavam o Flamengo em qualquer lugar do mundo.

Nos anos 60, consolidei a minha paixão por esse time. Eu tinha dois rádios – um fixo, daqueles que a gente ainda vê funcionando e que Luciano de Carlito tem uns dois para vender e caro, porque é transistorizado, segundo ele. Mas, acho que é caro pela quantidade de títulos do glorioso time que os rádios transmitiram.

O outro aparelho era um também Semp, portátil. Esse aí eu trouxe para Salvador e passei a admirar o time do Vitória.

Ter um rádio portátil era como um note-book nos dias de hoje. Estávamos sempre atualizados ouvindo os programas de rádio, as resenhas e as transmissões. Naturalmente, existiam as faixas de OC (ondas curtas) de 25 e 31 metros. Depois das cinco e meia da tarde, mudávamos para a faixa OM, que hoje se chama AM (amplitude modulation). A grosso modo, significa que as ondas médias não se propagam em longas distâncias devido a interferência da radiação solar. Ao por do sol, a sintonia era perfeita, portanto, o rádio Semp passou a ser o preferido porque era um dos poucos a “estourar” mais cedo as ondas OM 1220 khz da Rádio Globo. Sendo os jogos do Flamengo às cinco da tarde, ninguém podia perder nada. Então, é por isso que acho que o Rádio Semp é caro e é a “cara” do time. Flamenguista que se preza, sabe reconhecer isso.

Por muito tempo, eu e Paulin de Doca, acompanhamos dezenas de jornadas esportivas a partir das duas da tarde, quando a maioria das emissoras começava as transmissões. Naquele tempo, reinavam os locutores e suas identificações pessoais: Fiori Giliotti – Rádio Bandeirantes (Abrem-se as cortinas, começa o espetáculo...), Waldir Amaral (Você ouvinte é a nossa meta, pensando em você é que fazemos o melhor...) Jorge Cury – Radio Nacional (Passssaaaa de passagem!!!) e Doalcei Camargo – Rádio Tupy (Disparoooooooooooou, é gol!!!), mais tarde José Carlos Araújo, o Garotinho (Atirou, entroooouuuu... Golão, golão, golão).

Vejam que Paulin de Doca tem uma paixão revelada pelo rádio e imita Waldir Amaral como se estivesse sentado à beira do gramado. Nós ouvíamos todos os jogos do Flamengo e do meio da rua dava pra ouvir o rádio da casa de Doca.

O rádio sempre me trouxe emoções incomuns. Ouvi a Copa do Mundo da Inglaterra (1966), o milésimo gol de Pelé (1969), a Copa do Mundo do México (1970) e os campeonatos do Flamengo a partir de 1965.

A paixão dos campos a gente transferia para os famosos “times de botão”. Catava pedaços de plásticos, cortava em pequenos pedaços, derretia e montava os times com as caras dos jogadores que eram publicadas no Jornal dos Sports. O time de 1965 era o meu preferido: Valdomiro, Ditão, Murilo, Paulo Henrique, Jaime, Nelsinho, Neves, Carlinhos, Silva, Almir e Rodrigues.
Era comum comprar a flâmula comemorativa dos campeonatos ganhos. As fotos do time campeão eram coladas nas tendas do beco dos Artistas. Fazia coleção de tudo. Me restou uma Revista Placar com todos os times do Flamengo, que está toda digitalizada.

Me lembro de dois fatos relacionados com o Flamengo e a Festa do Divino. O primeiro eu era muito menino. Sola, meu primo, me deu a incumbência de ouvir um jogo final do Flamengo e tinha que descer na praça para avisar cada gol que o time fazia. Desci umas três vezes.

Mais recente, em 2001, já com televisão, a praça tava coalhada de gente com a camisa do Vasco e era a final do campeonato carioca. Terminou o jogo com aquele sensacional chute de Petkovick (43) e o Vasco se sagrou tri-vice. Fazia um frio intenso, só via os amigos sem camisa. Foi o dia em que ninguém sentiu frio em Poções.

Assim, via rádio, muitos se consolidaram como torcedores do Flamengo.

Falando em rádio, o jogo de hoje entre Flamengo e Vasco, só será possivel acompanhar via rádio, pela internet. Enquanto escrevo, escuto o Imperador liquidar a fatura. Pena (aliás, Dó-Dó) é que estou sentindo agora do rival. Mas é bom, está sendo ajudado para não ser vice, mais uma vez.

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2 comentários:

  1. Belo texto :) Quando me perguntarem agora porque eu, baiano, sou Flamengo, vou passar a responder: "porque meu pai é Flamengo". Aí recomendo esse texto, e quem não entender é porque não merece trela mesmo.

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  2. ANDRE LUIS MOITINHO FAGUNDES04 agosto, 2022

    Texto completo, rico em detalhes e cheio de emoção. A vida passa, ficamos marcados por muitas coisas que não nos deixam esquecer da nossa essência, e o futebol serve até de referência de tempo, os estádios, os títulos, os jogadores, os narradores, tudo enfim nos remete ao passado. Como um bom vascaíno sei reconhecer a grandeza do Flamengo e tive em Zico um dos meus maiores ídolos.

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