
O outro aparelho era um também Semp, portátil. Esse aí eu trouxe para Salvador e passei a admirar o time do Vitória.
Ter um rádio portátil era como um note-book nos dias de hoje. Estávamos sempre atualizados ouvindo os programas de rádio, as resenhas e as transmissões. Naturalmente, existiam as faixas de OC (ondas curtas) de 25 e 31 metros. Depois das cinco e meia da tarde, mudávamos para a faixa OM, que hoje se chama AM (amplitude modulation). A grosso modo, significa que as ondas médias não se propagam em longas distâncias devido a interferência da radiação solar. Ao por do sol, a sintonia era perfeita, portanto, o rádio Semp passou a ser o preferido porque era um dos poucos a “estourar” mais cedo as ondas OM 1220 khz da Rádio Globo. Sendo os jogos do Flamengo às cinco da tarde, ninguém podia perder nada. Então, é por isso que acho que o Rádio Semp é caro e é a “cara” do time. Flamenguista que se preza, sabe reconhecer isso.
Por muito tempo, eu e Paulin de Doca, acompanhamos dezenas de jornadas esportivas a partir das duas da tarde, quando a maioria das emissoras começava as transmissões. Naquele tempo, reinavam os locutores e suas identificações pessoais: Fiori Giliotti – Rádio Bandeirantes (Abrem-se as cortinas, começa o espetáculo...), Waldir Amaral (Você ouvinte é a nossa meta, pensando em você é que fazemos o melhor...) Jorge Cury – Radio Nacional (Passssaaaa de passagem!!!) e Doalcei Camargo – Rádio Tupy (Disparoooooooooooou, é gol!!!), mais tarde José Carlos Araújo, o Garotinho (Atirou, entroooouuuu... Golão, golão, golão).
Vejam que Paulin de Doca tem uma paixão revelada pelo rádio e imita Waldir Amaral como se estivesse sentado à beira do gramado. Nós ouvíamos todos os jogos do Flamengo e do meio da rua dava pra ouvir o rádio da casa de Doca.
O rádio sempre me trouxe emoções incomuns. Ouvi a Copa do Mundo da Inglaterra (1966), o milésimo gol de Pelé (1969), a Copa do Mundo do México (1970) e os campeonatos do Flamengo a partir de 1965.
A paixão dos campos a gente transferia para os famosos “times de botão”. Catava pedaços de plásticos, cortava em pequenos pedaços, derretia e montava os times com as caras dos jogadores que eram publicadas no Jornal dos Sports. O time de 1965 era o meu preferido: Valdomiro, Ditão, Murilo, Paulo Henrique, Jaime, Nelsinho, Neves, Carlinhos, Silva, Almir e Rodrigues.

Me lembro de dois fatos relacionados com o Flamengo e a Festa do Divino. O primeiro eu era muito menino. Sola, meu primo, me deu a incumbência de ouvir um jogo final do Flamengo e tinha que descer na praça para avisar cada gol que o time fazia. Desci umas três vezes.
Mais recente, em 2001, já com televisão, a praça tava coalhada de gente com a camisa do Vasco e era a final do campeonato carioca. Terminou o jogo com aquele sensacional chute de Petkovick (43) e o Vasco se sagrou tri-vice. Fazia um frio intenso, só via os amigos sem camisa. Foi o dia em que ninguém sentiu frio em Poções.
Assim, via rádio, muitos se consolidaram como torcedores do Flamengo.
Falando em rádio, o jogo de hoje entre Flamengo e Vasco, só será possivel acompanhar via rádio, pela internet. Enquanto escrevo, escuto o Imperador liquidar a fatura. Pena (aliás, Dó-Dó) é que estou sentindo agora do rival. Mas é bom, está sendo ajudado para não ser vice, mais uma vez.
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