Disse que quando uma pessoa morria na pequena Mormanno, na
Itália, ele era encarregado de fazer o caixão. Chamava um amigo e, em menos de
duas horas, a encomenda já estava pronta.
Local onde funcionou a marcenaria de Chico, em Mormanno |
Eu acreditava piamente nesse caso contado. Um dia, viajando pela
região, cheguei em Poções e perguntei por meu pai. - Ta lá em cima, vá ver o que ele está fazendo, me falou Michele. Encontrei-o
terminando um caixão feito com alguns restos de tábuas que havia juntado por longo tempo. Já estava lixando as laterais.
- Veja essa junta da
parte mais larga, coloquei um reforço e ficou muito bom. Se sua mãe não
reclamasse, eu ia guardar para mim. Vou fazer um acolchoado dos bons, o
defunto não vai reclamar.
Ele respeitava o pavor de minha mãe pelos caixões. Revendia modelos industrializados
e os deixava no pequeno quarto da loja, escondidos para ela não ver. A gente
sabia que ele gostava de tirar uma soneca. Quando saia depois do almoço de
domingo, ia direto para a loja tirar a soneca dentro do caixão. Justificava
dizendo que estava testando os mesmos para saber qual era o melhor.
Mas, minha mãe sabia que quando alguém batia à porta fora de
hora, principalmente se a pessoa estava a cavalo, era para Chico despachar um
funeral. Cansei de acompanhá-lo diversas vezes nesses atendimentos, uma
recomendação dela para que ele não ficasse só.
Primeiro, perguntava o sexo e a idade. Fazia diferença no que
ia oferecer. Depois, perguntava a causa da morte. Normalmente, balançando a cabeça, respondia ao freguês: “coitado”. Começava, então,
a separar os tecidos do caixão pelas cores correspondentes às respostas. O normal era enterrar as pessoas com uma mortalha. Branco se fosse um
“anjo” (criança) ou mulher. Azul para homens. O cordão de Santo
Antônio era de uso comum.
A depender do peso, reforçava na quantidade de alças – de
quatro, pulava para seis unidades. Chegava a hora de escolher os enfeites do
caixão, que eram figuras de anjos, palmas, o crucifixo, o rosto de Cristo ou de
Nossa Senhora, os arremates laterais e as quinas – todos de papelão revestidos
de material laminado. Vela e incenso eram de graça.
Na hora de embrulhar, cortava o papel e relacionava os itens
com os preços para o freguês levar para prestar conta à família do falecido.
Colocava tudo num embornal e seguia viagem a cavalo. Normalmente, a pessoa que
comprava era a mesma para cada interior do município.
Essa foi a contribuição que Chico deu na época em que não existiam
funerárias em Poções.
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