Por RUY ESPINHEIRA FILHO
A
vereadora Zezel Leite, de Poções, confirmou-me a notícia: a antiga
escola estadual Luiz Viana Filho foi municipalizada e hoje se chama
Affonso Manta Alves Dias – nome completo do poeta Affonso Manta.
Nada mais justo, já que ele, embora tenha nascido em Salvador e
passado a infância em Iguaí (então distrito de Poções), foi
naquela cidade que morou quase toda a vida – com exceção do tempo
em Iguaí, dos anos de estudo em Salvador e dos que viveu no Rio de
Janeiro, como inspetor dos Correios e Telégrafos. Aposentado por
motivos de saúde, retornou a Poções e lá permaneceu de 1975 até
sua morte, em 2003.
A
poesia de Affonso Manta é marcada de profundo lirismo, oscilando
(como dividi a antologia que dele organizei e foi lançada no ano
passado) entre a poética confessional, a amorosa, a de temática
variada e a de cunho religioso ou místico. Minha amizade com o poeta
começou na juventude: eu com treze ou catorze anos, ele com
dezesseis ou dezessete. Todas as tardes nos sentávamos no coreto do
jardim de Poções, ao lado da velha Matriz, perto da qual ele viveu
grande parte da vida, e conversávamos até depois do crepúsculo.
Ou, mais exatamente, ele falava e eu escutava — maravilhado com
aquele rapaz que já tinha lido tanto e se referia desenvoltamente a
ficcionistas, filósofos, sobretudo a poetas e poesia.
Nossos
contatos se intensificaram a partir de 1961, quando vim estudar em
Salvador, onde ele já se encontrava. Poeta respeitado, boêmio
impenitente, foi quem me apresentou a pessoas brilhantes da
literatura e das artes — como Carlos Anísio Melhor, Fred Souza
Castro, Jehová de Carvalho e Ângelo Roberto, entre outros. De
personalidade muito complexa, foi ele um solitário e um boêmio. Seu
lirismo é pungente, às vezes delirante, muitas vezes sábio e
compassivo. A sua poética é densa de magia, como se lê em “Lá
vai Affonso Manta”, que assim começa: “Com estrelas na testa de
rapaz./Com uma sede enorme na garganta,/Lá vai, lá vai, lá vai
Affonso Manta/Pela rua lilás.” A pungência do confessional pode
ser exemplificada pela primeira estrofe de “O realejo de vinho”:
“Para quem me queira ouvir: /Sou um homem aos frangalhos. /Parte
por culpa de tudo. /Parte por culpa de nada.” De seu lirismo de
sabedoria, colhemos o final de “Criação”: “Crie esses bois de
chifres de açucenas/Que pairam nos céus das manhãs
serenas.(...)/Crie raiz no amor de uma mulher/E espere calmamente o
que vier.”
Affonso
foi poeta pouco conhecido. Mas reservei alguns exemplares da sua
antologia para enviar a escritores, críticos e leitores especiais
pelo país afora, despertando manifestações de admiração e de
espanto pela descoberta de um autor tão importante e de quem nunca
tinham ouvido falar.
O
nome do poeta numa escola honra o poeta – e principalmente honra a
cidade em que ele viveu e que sempre amou. Nomes de políticos e
apaniguados são dados a tudo, sem falar nos abominavelmente
vergonhosos. Todas as cidades estão densamente poluídas por tais
excrescências e ninguém parece se incomodar com tamanho horror.
Portanto,
é algo que lava a alma ver o nome de um poeta ser lembrado. De
parabéns Affonso Manta, Poções - e a poesia brasileira.
(Publicado no jornal A
TARDE, 24/07/2014)
Parabenizo aos Vereadores de Poções por terem essa feliz iniciativa de homenagear o ilustre “poçoense por direito” Affonso Manta, dando o seu nome ao Instituto Municipal de Educação.
ResponderExcluirPor um período curto, ele foi meu professor no Ginásio Estadual de Poções.
A sua família, no início da década de 60, foi praticamente nosso vizinho e apesar da diferença de idade entre mim e ele, era clara e diferenciada a sua pujança nos conteúdos filosóficos e intimista da alma.