"Se chorei ou se sorri, o importante é que em Poções eu vivi"

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Elpídio - uma história dos anos 60

O casal viajava com uma criança e, perto de Poções, ocorreu o acidente. O marido foi levado para a cidade de Vitória da Conquista devido a necessidade de cuidados médicos. A esposa faleceu e o sepultamento foi feito em Poções. A pequena criança nada sofreu e ficou na nossa casa. Devia ser o ano de 1965.

Durante aproximados cinco dias, recebeu os cuidados de minha mãe, da minha irmã Elisa e dos vizinhos da rua. Ficamos triste pelo fato, mas alegres pela presença daquela criança de poucos meses de nascida em nosso meio. A gente se debruçava na cama e ficava esperando pelo choro de fome. Mamadeira pronta, logo ele se calava e voltava a dormir.

Se chamava Elpídio, nascido em Andaraí, na porta da Chapada Diamantina. Os seus parentes vieram buscar e nunca mais tivemos notícias. Todas as vezes que ia ao cemitério, quando via o túmulo de Dona Maria de Lourdes, a sua mãe, lembrava-me de Elpídio.
Comentei várias vezes com Elisa e a pergunta sempre era a mesma: - Será como está aquela criança que ficou lá em casa?

Pois bem. No início dos anos 80, eu viajei e passei por Andaraí. Enquanto consertava o pneu do carro, perguntei ao borracheiro se conhecia Elpídio, se tinha notícias de como estava ele. Soube responder que o pai era advogado, se chamava Luiz e havia se mudado para Salvador.

Recentemente, meu filho Ricardo viajou para um final de semana em Andaraí. Eu lhe contei a história e pedi que perguntasse por Elpídio. Ele não fez e entre diversos contos da viagem falou que uma pessoa esteve sempre presente desde a compra da passagem, mesmo ônibus de ida e no mesmo de volta. Para sua surpresa, quando chegou na porta de casa, essa pessoa passava em direção ao prédio vizinho. Falou que era uma pessoa que usava barbas, um senhor nos seus 60 anos. Registrei a informação.

Outro dia, desci e fui aqui no mercadinho de Antônio, vizinho do meu prédio. Sempre encontro alguém do interior e nesse dia encontrei Pedro, o vascaíno, que é de Ibotirama. Chegou um senhor de barba e Pedro gritou logo – esse daí é de Andaraí. Era Gerson, a pessoa que estava na viagem do meu filho. Liguei os fatos e perguntei logo se ele conhecia Elpídio. Ele coçou a barba e fui municiando com outros dados e ele se lembrou.
 - Ah, ele é filho de Luiz Gomes Fonseca, sua história está certa, eu me lembro desse fato. Elpídio, hoje, mora em São Paulo e é um grande magistrado, homem inteligente. Se chama Elpídio Dantas Fonseca.

Que essa história chegue a Elpídio e ele saiba o quanto a rápida convivencia nos marcou (o Google mostra que Elpídio Mário Dantas Fonseca é um tradutor de grandes obras literárias  - será a mesma pessoa?). 




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10 comentários:

  1. Se é a mesma pessoa eu não sei, mas que Elisa, minha mãe, ficou emocionada depois de ler a historia de Elpídio,isso é verdade!!!

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  2. Prezado Luiz Sangiovanni,

    Que Deus o abençoe, à sua mãe e à sua irmão Elisa. De fato, a criança com 9 meses, em julho de 1967, sou eu e até o fim de sua vida, em 1 de setembro de 2000, meu pai, Luiz Gomes Fonseca, ainda chorava quando se lembrava do acidente em que perdeu minha mãe. Na verdade, minha irmã, Etelvina Marieta Dantas Fonseca – á época com 1 ano e seis meses, que também estava no automóvel, dirigido por um motorista, acompanhou meu pai a Vitória da Conquista, pois também teve fraturas.

    Li comovido o seu texto, que me trouxe lágrimas de alegria e de agradecimento à sua mãe, à sua irmã Elisa, a você e aos vizinhos que cuidaram daquela criança de 9 meses. Creio que, em 1975, meu pai levou os restos mortais de minha mãe a Andaraí, onde descansam.

    Recentemente, de 2 de agosto a 21 de agosto deste ano, estive com minha esposa, Cristina Nicoleta Manescu em Andaraí, aonde eu não retornava fazia 34 anos...

    Tive uma infância e adolescência de muito amor, que me foram conferidos por meu pai, e minha madrasta, Elba Silva Fonseca, que me tratou melhor do que a um filho (No momento ela luta bravamente contra um câncer). Formei-me em direito pela São Francisco aqui em São Paulo, onde resido desde 1967. Sou Procurador do Estado desde 1990, e não magistrado, e tenho alguns livros traduzidos do romeno (minha esposa é romeno-brasileira) e do inglês.

    As informações de que você dispunha estavam quase todas corretas, e poderão agora ser retificadas conforme as informações que presto acima.

    Na nossa próxima ida à Chapada, gostaria de conhecê-lo pessoalmente, e à sua mãe e à sua irmã Elisa.

    Bendita invenção esta da internet!

    Mais uma vez, muito obrigado por essa sua crônica, repassada de ternura e pelos cuidados que tiveram comigo.

    Um grande abraço,
    Elpídio

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  3. Mais uma vez me emociono com esta história, foram dias de tensão, consternação e muita emoção.
    Bom saber que ele está bem, é para nós uma sensação de termos feito o que foi de melhor para contribuir com aquele momento.
    Espero que possamos nos encontrar em algum momento, revivo hoje todas aquelas sensações de cuidar daquela criança indefesa mas alí cuidada e querida.Hoje sabemos o final da história.
    Que a Dona Elba consiga a vitória da sua luta.
    Um grande abraço para você Elpídio e sua família
    Elisa Sangiovanni

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  4. Prezada Elisa,

    Não imagina a emoção que me tomou ao ler o texto de seu irmão, Luiz Sangiovanni, que me chegou como numa carta dentro de uma garrafa lançada ao mar – se bem que o mar da internet seja mais navegável do que o mar real...Coloquei a esmo meu nome no google, e vi o título da crônica, e achei curioso, imaginando, antes de lê-la de que se tratasse de algum xará meu de 1960.
    Vou incluí-los em minhas orações, e desde já agradeço-lhes imensamente pelos cuidados, carinho e amor dedicado a uma criança desconhecida, em cujo nome, posso, agora agradecer.
    Sim, meus queridos, você fizeram o melhor e não tenho como agradecer-lhes.
    Obrigado pelos votos de saúde para Elba.
    Mandei um e-mail ao Luiz, ali colocando nosso telefone, e-mail e skype.
    Pretendo voltar a visitar a Chapada Diamantina com minha esposa – que chorou ao ler o texto e me deu um abraço apertado – provavelmente já no próximo ano e queríamos, muito, mas muito mesmo, conhecê-los pessoalmente e levar, em pessoa também, a nossa gratidão

    Um grande abraço para você, Elisa, e muitas bênçãos de Deus para você e para os seus
    Elpídio Mário Dantas Fonseca

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  5. Luiz Sangiovanni17 setembro, 2012

    Prezado Elpídio,
    Solicito que envie o seu endereço de email para luiz.sangiovanni@gmail.com

    Quando recebo qualquer comentário, o sistema do blog não mostra a origem.

    Confesso que estou muito emocionado com as suas palavras e todo o desenrolar dos fatos. Realmente, uma história que carreguei comigo por muitos anos e tinha que escreve-la, pois pertence a você e se perderia no tempo se não fosse publicada.

    Estou muito emocionado e feliz.

    Curiosamente, encontrei hoje com o Sr. Gerson e o Pedro. Este último me disse que havia dado a crônica impressa ao Gerson e perguntou se havia ocorrido alguma evolução na história. Outra curiosidade: você estava em Andaraí, 34 anos depois, na mesma data que escrevi e publiquei a crônica.

    Um grande forte abraço,
    Luiz Sangiovanni (Lulu)

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  6. Prezado Luiz Sangiovanni,

    Sou amigo de Elpídio e acabei de ler a história muito tocante contada pelo senhor. Tive de escrever.
    Tive, pois sinto-me na obrigação de agradecer-te também - ao senhor e à sua família - por terem sido "guardadores de meu irmão".

    Hoje, em casa de Elpídio e Cristina, conversávamos sobre a absoluta falta de sentido que vive nossa sociedade atual; e é um bálsamo vindo de Deus – para contrariar nossas expectativas – saber que ainda existem pessoas assim, humanas.

    Uma frase muitíssimo banalizada atualmente, da famosa personagem de Saint-Exupery (neste caso, a raposa e não o príncipe), está aqui, neste caso, expressa em sua significação mais sublime:

    "Cativar significa criar laços".

    Como pode, passados mais de 40 anos, alguém ainda se perguntar por outrem? Ainda mais sendo esse outrem, à época, um bebê de 07 meses?!

    Hoje, num determinado momento de nossa tarde agradabilíssima, discutíamos algumas afirmações a respeito de Deus, feitas por um filósofo romeno que Elpídio traduzira. Porém, e para além de todas investidas intelectuais que fazíamos a certa altura, Elpídio dizia: “Deus é misericordioso”. Nós insistíamos em voracidade intelectual. Elpídio relutava: “Deus é soberano”. Eu disse: “não aceito essa resposta; pelo menos nesse contexto”.

    Mas, diante do que li aqui, agora só posso dizer uma coisa:

    Elpídio, meu amigo, estás absolutamente certo!

    E o senhor, Luis Sangiovanni, foi, com sua família, instrumento dessa misericórdia.


    Abaixo, segue um link para que vejam – através de uma singela homenagem que fiz – quem é, hoje, essa criança de 07 meses em quem depositaram tanto carinho:

    http://paulopoeta.blogspot.com.br/2010/10/e-esperanca-nao-traz-confusao-rm-55a.html

    Mais uma vez, obrigado!


    Saudações,
    Paulo Cruz.

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  7. Maria Fernanda17 setembro, 2012

    Meu querido amigo Lu

    São pessoas como você que me fazem acreditar numa vida melhor!!
    Os detalhes da memória, o cuidado com os outros à sua volta... e um re-encontro tão profundo como esse!

    Meu muito obrigada por você existir e ser exatamente como é!
    Ao Sr. Elpídio, meu muito obrigada pela resposta, pela atualização e por completar, de forma tão transparente esta história rica em emoções e humanidade!

    Muito me emocionou e começo a semana com outra visão do mundo e das pessoas...

    Nanda

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  8. E eu, que me chamo Maria Isabel, que moro em Fortaleza e que dos "personagens" dessa história toda, de afeto, solidariedade, reconhecimento e gratidão, só conheço o Luiz Sangiovanni, meu amigo Lu, estou cheia de emoção! Muito lindo tudo isso, muito lindo saber que existem famílias como essas - tanto. SANGIOVANNI, como. FONSECA que nos falam do BELO na vida. E Gerson, e Pedro, que ajudaram a história a se completar! Muito bom começar a semana com ISSO TUDO!

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  9. San,

    Vamos ficando, digamos, mais experientes(para não dizer velhos) e mais emotivos. Li sua crônica e terminei de ler os comentários com lagrimas rolando.

    VOCÊ NÃO EXITE, CARA!!!

    Obrigado e um grande abraço.
    Sérgio Queiroz

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  10. Mais uma vez releio tudo, passa um filme na minha cabeça..mas outra vez as lágrimas rolam sem controle... emoção tão forte como a sentida anos atrás.

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