Antes de começar a escrever, fui olhar no dicionário Aurélio o verdadeiro significado da palavra “sereno”. Encontrei nada menos que 8 significados e uma expressão – Ficar no sereno, o mesmo que ‘apreciar festa do lado de fora’.
Era exatamente o tema que queria escrever e tamanha a surpresa porque não imaginava que a expressão é a pura realidade de um fato interessante que existiu em Poções – o sereno – aquelas pessoas que ficavam do lado de fora do clube.
Embarquei nas minhas lembranças e parei na porta do Clube Social União das Classes, na praça da Liberdade, lá pelo final da década de sessenta. Ninguém precisava ir a uma festa para saber se era boa ou ruim. Bastava ter agitação e público do lado de fora que a festa era boa. Eram duas turmas e em planos diferentes.
O primeiro plano do sereno era o “gargarejo”, ou seja, o pessoal que colocava alguns paralelepípedos bem abaixo da janela do clube e ficava com o queixo apontado para a pista de dança. Essa turma aí se responsabilizava em espalhar as notícias de quem dançou com quem, se dançou apertado, se namorou na festa ou quantas “malas” o sujeito tomou. O garçom já era avisado para não fechar as janelas, independente do frio. Nos chás dançantes só havia este tipo de sereno.
O segundo plano ficava mais distante, do outro lado da rua. A balaustrada da praça era o ponto onde se observava as pessoas que estavam se dirigindo para festa. Davam nota da roupa, dos expulsos da festa por bebedeira ou briga, da orquestra que era chamada de “jazz” pela predominância por muito tempo dos instrumentos de sopro. Visão privilegiadíssima dos acontecimentos.
Lá dentro, uma novidade, a luz negra. As camisas “balon” e “cacharrel” na cor verde-cana e as calças brancas ajudavam ao pessoal do sereno a identificar quantas vezes o casal circulava pelo salão. Vestir roupa escura era o segredo para quem queria namorar. As roupas berrantes para ficar em evidência.
No palco, uma turma nova estreava na música. Vestidos de roupas pretas, eram “Os Fantasmas” o primeiro grupo a acompanhar o estilo musical da época. Sandoval França dava os seus primeiros acordes na guitarra. Me lembro de Tonhe Banana, Albérico, Lourinho no contra-baixo, Pia no trompete, Jeová na bateria e depois Zé Tenaz. Zé Carlos, Chicão e Pitoco chegaram depois e harmonizaram o vocal, mais aí já havia mudado também o nome da banda (Sandoval, me corrija se estiver errado quanto à formação da banda. Me lembro que havia um revezamento quando os Fagundes chegavam de férias em Poções).
No salão, a distribuição das mesas era sempre igual. O mapa já vinha com as reservas daqueles que frequentavam todas as festas. Das 22 horas à meia noite, ainda ficavam os chefes de família e o comportamento era mais discreto. Depois, a luz era reduzida e o bar começava a ficar vazio, pois todo mundo queria dançar. No corredor ao lado do salão, longe dos olhares do pessoal do “sereno” e das mesas, o namoro rolava solto.
Próximo ao ano de 1970 foi construída a ACASCP, Associação de Cultura e Assistência Social da Cidade de Poções, defronte ao Ginásio.
Os muros do novo clube acabaram com o “sereno”.
Mas antes de acabar, ocorreu uma grande festa e o nosso clubinho superlotou. Era um reveillon. Não havia espaço para dançar, as mesas haviam se esgotado, o bar inacessível. Ficamos na festa por meia hora e resolvemos formar uma turma e ir lá prá casa dançar, beber e conversar mais tranquilamente.
Lá pelas quatro horas da madrugada, eu resolvi voltar ao clube e avisei ao pessoal que iria batalhar uma “galinha morta”. Na verdade, se usava essa expressão para as meninas que não tinham se “arrumado” ou que ainda estivessem “sobrando”.
Dobrei o beco da Coelba e já via o movimento de gente saindo, descendo a Olímpio Rolim. A festa tava rala, pouca gente e muitos bêbados. Dei uma volta no salão, tomei uma cerveja e voltei para casa.
A nossa festa ainda rolava e o povo aceso. A mesa estava posta com alguns pratos e quando entrei, o pessoal parou e perguntou:
- Cadê a galinha? Tá todo mundo morrendo de fome!
- Que galinha? respondi.
- A galinha, aquela que você foi buscar!
- Tinha acabado. Vai ficar prá próxima festa!
Até hoje, Marivaldo Soares, o genro de Luiz Sarno, se lembra desse fato toda vez que a gente se encontra nas barracas da Festa do Divino. Aliás, a Festa também se transformou em um grande sereno.
Era exatamente o tema que queria escrever e tamanha a surpresa porque não imaginava que a expressão é a pura realidade de um fato interessante que existiu em Poções – o sereno – aquelas pessoas que ficavam do lado de fora do clube.
Embarquei nas minhas lembranças e parei na porta do Clube Social União das Classes, na praça da Liberdade, lá pelo final da década de sessenta. Ninguém precisava ir a uma festa para saber se era boa ou ruim. Bastava ter agitação e público do lado de fora que a festa era boa. Eram duas turmas e em planos diferentes.
O primeiro plano do sereno era o “gargarejo”, ou seja, o pessoal que colocava alguns paralelepípedos bem abaixo da janela do clube e ficava com o queixo apontado para a pista de dança. Essa turma aí se responsabilizava em espalhar as notícias de quem dançou com quem, se dançou apertado, se namorou na festa ou quantas “malas” o sujeito tomou. O garçom já era avisado para não fechar as janelas, independente do frio. Nos chás dançantes só havia este tipo de sereno.
O segundo plano ficava mais distante, do outro lado da rua. A balaustrada da praça era o ponto onde se observava as pessoas que estavam se dirigindo para festa. Davam nota da roupa, dos expulsos da festa por bebedeira ou briga, da orquestra que era chamada de “jazz” pela predominância por muito tempo dos instrumentos de sopro. Visão privilegiadíssima dos acontecimentos.
Lá dentro, uma novidade, a luz negra. As camisas “balon” e “cacharrel” na cor verde-cana e as calças brancas ajudavam ao pessoal do sereno a identificar quantas vezes o casal circulava pelo salão. Vestir roupa escura era o segredo para quem queria namorar. As roupas berrantes para ficar em evidência.
No palco, uma turma nova estreava na música. Vestidos de roupas pretas, eram “Os Fantasmas” o primeiro grupo a acompanhar o estilo musical da época. Sandoval França dava os seus primeiros acordes na guitarra. Me lembro de Tonhe Banana, Albérico, Lourinho no contra-baixo, Pia no trompete, Jeová na bateria e depois Zé Tenaz. Zé Carlos, Chicão e Pitoco chegaram depois e harmonizaram o vocal, mais aí já havia mudado também o nome da banda (Sandoval, me corrija se estiver errado quanto à formação da banda. Me lembro que havia um revezamento quando os Fagundes chegavam de férias em Poções).
No salão, a distribuição das mesas era sempre igual. O mapa já vinha com as reservas daqueles que frequentavam todas as festas. Das 22 horas à meia noite, ainda ficavam os chefes de família e o comportamento era mais discreto. Depois, a luz era reduzida e o bar começava a ficar vazio, pois todo mundo queria dançar. No corredor ao lado do salão, longe dos olhares do pessoal do “sereno” e das mesas, o namoro rolava solto.
Próximo ao ano de 1970 foi construída a ACASCP, Associação de Cultura e Assistência Social da Cidade de Poções, defronte ao Ginásio.
Os muros do novo clube acabaram com o “sereno”.
Mas antes de acabar, ocorreu uma grande festa e o nosso clubinho superlotou. Era um reveillon. Não havia espaço para dançar, as mesas haviam se esgotado, o bar inacessível. Ficamos na festa por meia hora e resolvemos formar uma turma e ir lá prá casa dançar, beber e conversar mais tranquilamente.
Lá pelas quatro horas da madrugada, eu resolvi voltar ao clube e avisei ao pessoal que iria batalhar uma “galinha morta”. Na verdade, se usava essa expressão para as meninas que não tinham se “arrumado” ou que ainda estivessem “sobrando”.
Dobrei o beco da Coelba e já via o movimento de gente saindo, descendo a Olímpio Rolim. A festa tava rala, pouca gente e muitos bêbados. Dei uma volta no salão, tomei uma cerveja e voltei para casa.
A nossa festa ainda rolava e o povo aceso. A mesa estava posta com alguns pratos e quando entrei, o pessoal parou e perguntou:
- Cadê a galinha? Tá todo mundo morrendo de fome!
- Que galinha? respondi.
- A galinha, aquela que você foi buscar!
- Tinha acabado. Vai ficar prá próxima festa!
Até hoje, Marivaldo Soares, o genro de Luiz Sarno, se lembra desse fato toda vez que a gente se encontra nas barracas da Festa do Divino. Aliás, a Festa também se transformou em um grande sereno.